Ao chegar de carro por uma estrada de terra arenosa, uma placa dá as boas-vindas a Assunção do Piauí, "a capital do feijão". Mas as letras desbotadas, quase apagadas, deixam claro que a principal atividade econômica local já viu melhores dias. Na pequena cidade, a 270 km de Teresina, as colheitas fracas estão fazendo muitos desistirem de plantar feijão. "Aqui é assim, a gente só trabalha no escuro. Num ano dá e no outro não dá", diz a dona de casa Francisca Pereira Moreno, mãe de cinco filhos.
Depois de conversar com alguns moradores de Assunção, perguntar onde cada um trabalha parece perder sentido. Os principais empregos da cidade são na prefeitura local, mas para adultos como Francisca, que não sabe ler nem escrever, a única opção está na roça ou nos serviços domésticos. Sem alternativas, a maioria sobrevive do Bolsa Família. "Tem que ter o Bolsa Família. Porque a renda aqui do feijão não está dando dinheiro. Dá R$ 60, R$ 70", fiz Francisca.
Oportunidades insuficientes
Com 7,5 mil habitantes, Assunção do Piauí, visitada pela BBC Brasil em janeiro, teve em 2010 o 10º pior rendimento per capita domiciliar do País - uma média de R$ 137 reais, contra R$ 1.180 de São Paulo. A taxa de analfabetismo é de quase 40% entre pessoas com 15 anos ou mais. A cidade tem quase 1.500 famílias beneficiárias do Bolsa Família. "Muitos ficam na fila de espera (do programa) porque a Assunção já extrapolou a cota que o Ministério do Desenvolvimento estipula para cada cidade", diz a assistente social Ana Alaídes Soares Câmara, que trabalha no Centro de Referência de Assistência Social da cidade.
O terço mais difícil
Desde o Plano Real, a pobreza caiu 67% no Brasil, algo inédito na série estatística, disse o pesquisador Marcelo Neri, do Centro de Políticas Sociais da FGV. "Falta o último terço, que é o mais difícil da jornada." Para Neri, é possível que o número de extremamente pobres seja até menor do que o estimado pelo Censo, se for levada em conta a renda obtida em transações não monetárias, como trocas e agricultura familiar. "Pelo Pnad (Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios, também do IBGE), essas pessoas seriam 5,5% da população", disse o pesquisador da FGV.
Faltam atividades econômicas
Mas um relatório do Ipea tenta traçar um perfil desse Brasil que demora a crescer: em 2009, 41,8% das famílias extremamente pobres eram formadas por casais com uma a três crianças; 29% eram agricultores e 34% eram inativos (não trabalhavam nem procuravam emprego). Dados do Censo 2010 indicam que muitos desses bolsões extremamente pobres se concentram em cidades de porte mediano, de entre 10 mil e 50 mil habitantes.
Estratégias
Como, então, combater essa pobreza extrema? A presidente Dilma Rousseff lançou como uma das prioridades de seu governo o programa Brasil Sem Miséria, que tem a ambiciosa meta de erradicar a pobreza extrema até 2014 e que foca as pessoas com renda per capita mensal de até R$ 70.
Iniciado em junho do ano passado, o plano contém ações que complementam o Bolsa Família, com programas para fomentar o emprego, a capacitação profissional e atividades econômicas locais, bem como o aumento da oferta de serviços públicos como saúde, educação e saneamento. Os especialistas ouvidos pela BBC Brasil elogiam o foco estabelecido pelo programa, mas o projeto tem óbvias dificuldades em levar serviços, renda e oportunidades para as pessoas mais excluídas.
"É preciso localizar (as populações empobrecidas), levar serviços públicos, com agentes sociais. É algo mais caro, mais artesanal", afirmou Neri, da FGV. Para Osório, uma alternativa seria aumentar os valores pagos pelo Bolsa Família.
"A maior parte dos extremamente pobres já faz parte do programa. Se aumentarem os valores, daremos um baque na pobreza." Mas os pesquisadores concordam que o grande estímulo para a saída da pobreza é a geração de empregos - e o desafio do Brasil é conseguir gerar vagas em áreas mais pobres justamente num momento de desaceleração econômica. "Gerar empregos depende, em última instância, da economia", disse Osório. "E o cenário é adverso, apesar de ser o melhor caminho. Isso pode não ocorrer com a mesma intensidade do que nos anos de crescimento."
FONTE:BBC
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